Jejuar do mundo

Jejuar do mundo

 

É
possível jejuar das notícias inúteis e das imagens do mundo
 

A
Quaresma é um tempo no qual vivemos a tensão para encontrarmos o equilíbrio
certo, o momento exato, a fórmula ‘mágica’ para vivermos a tríplice ordem –
jejum, esmola e oração. Sabemos que a Igreja nos ensina várias modalidades para
mergulharmos nesta intimidade com Jesus por meio desses atos. Porém, ela
não fecha em uma forma exata, dogmatizada, sobre como devemos praticar o
jejum, a esmola e a oração. 

Assim, para encontramos a medida certa precisamos ser criativos, sobretudo no
que diz respeito ao jejum. Clemente de Alexandria, em sua criatividade, nos
ensinou a “Jejuar do Mundo”, ou seja, a nos afastarmos das situações rotineiras
que não nos colocam em comunhão com Jesus. Essas modalidades são chamadas
extracanônicas (cf., Estromatas, II, 15: GCS 15,242).

Para explicarmos isso melhor recorremos à proposta de “Jejum do
Mundo” ensinada pelo Frei Ranieiro Cantalamessa – pregador da Casa
Pontifícia, no livro “Preparai os Caminhos do Senhor”.

Segundo ele existe um tipo de mortificação possível a todos e, acima de tudo,
benéfica, que é o jejum das notícias inúteis e das imagens do mundo. O
religioso afirma que vivemos em um mundo no qual a comunicação em massa nos
bombardeia com notícias, informações, propagandas, imagens que corroem a nossa
vida espiritual. 

Essas informações e imagens, presentes na televisão, na publicidade, nos
espetáculos, nos jornais, nas revistas, na internet tornaram-se o veículo
privilegiado para a expansão da ideologia mundana, consequentemente nos afastam
da união com o Senhor. Podemos constatar isso na nossa vida, sabemos o quão
difícil é nos recolhermos para rezar em meio a tanto “barulho”. Um
exemplo claro disso é quando acabamos de nos “encher” de algumas
informações e vamos rezar, parece que não “desligamos”, ficamos
pensando no celular que poderá tocar, na notícia que acabamos de receber, na
fofoca que ouvimos ou falamos, daquela bendita música – secular, que não sai da
nossa cabeça –, enfim, levamos em nosso coração todos aqueles emaranhados de
notícias que acabamos de ouvir e ver. 

Portanto, não é possível encher os olhos, a mente e o coração com essas imagens
e informações e depois querer rezar.

Frei Raniero afirma ainda que “o
Reino de Deus tem as suas notícias eternas, sempre novas, a serem ouvidas, e,
pelo fato de estarmos tomados pela paixão das notícias do mundo, não mais as
compreendemos. Parecem-nos apenas coisas velhas superadas, não a proclamaremos
com força, pois elas não vivem com força dentro de nós
“.

Podemos, dessa forma, em meio à rapidez das informações, dedicar nosso
tempo gasto com a procura destas informações inúteis à oração, por intermédio
do Jejum do Mundo, pois todo pequeno esforço pode se transformar em uma ocasião
de encontro com Deus. Assim, desviando o nosso olhar da ilusão (cf. Sl 119,37),
teremos acesso às notícias eternas, as quais somente os corações íntimos do
Senhor podem ver.

Ricardo Gaiotti Silva
ricardo@geracaophn.com